Virgínia Fróis, Instituto de
Artes-UNESP-SP, 08 de agosto de 2012.
Este projeto das
RESSONÂNCIAS em SP, foi uma partilha, um estender a outros, uma questão que sendo a minha, certamente é comum aos
humanos.
Partirá da vossa disponibilidade para trabalhar as vossas questões
interiores.
Assim a proposta é produzir uma peça com todos, ser uma partilha.
Partiremos da cabeça como objeto a trabalhar, como forma. A aprendizagem da
técnica da conformação sucessiva, da
repetição, das relações com as matérias, como meios, com os processo ou com o
objeto final.
Uma aprendizagem que vem do corpo e com o corpo. A vossa cabeça é o
modelo, as mãos dão forma, modelam e no acabar acariciam e devolvem à cabeça um
pensamento feito desse estar no colo, silencioso e individual.
Partimos de uma idéia antiga. Entendo
Ressonância como a relação com um outro. Uma coisa nossa que ressoa no
outro (identificação) e que retorna mais clara ou por vezes mais complexa.
Comecei a desenvolver as idéias a partir de uma obra que fiz para uma
exposição na Casa das Artes Jorge Vieira, alguns anos após a morte do escultor.
Fiz duas cabeças-urna suspensas.
O Jorge Vieira, foi um Professor com quem iniciei o meu trabalho como
docente na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Fui sua assistente, quando ele
já estava já no final da sua carreira docente. Nunca fui sua aluna mas conhecia
bem a sua obra. Ele era uma pessoa muito especial, com quem aprendi muito.
Desses anos ficou uma boa amizade.
No dia em que ele morreu (dezembro de 1998) eu inaugurava uma exposição
com o titulo MORADAS.
A ultima peça que realizei para essa exposição era uma urna que se apresentou suspensa do
teto, a minha primeira peça suspensa. Esta peça foi modelada na praia, com o
barro retirado de numa falésia junto ao mar, num período de férias: via o mar,
sentia o calor no meu corpo e na sombra,
pensava ao modelar os potes, que as cinzas
de um corpo cabiam dentro de um volume igual à nossa caixa crâniana.
Depois em 2005 publicava num livro de homenagem a Jorge Vieira, nos 10
anos do museu este texto:
Uma assinatura em espiral (*)
Sobre a areia
a
assinatura,
o movimento do meu corpo evoca a vida .
No ar a matéria volatiliza-se em helicoidais
de calor e fumo.
No dia claro e límpido,
os pés quentes percorriam a areia, sentiam a
água gelada.
Alguma cinza
No interior do vaso do tamanho da cabeça de
um homem
O pó fino e leve
De um corpo inteiro.
Na urna de terra cota, guardo a memória do
prazer da vida.
No profundo Mar
dorme o vaso,
sais,
minerais,
silicatos, carbonatos e nada mais.
(*) Nas 1º anos as obras dos do
escultor JV eram assinadas com uma espiral
É nesta sequência
de associações que realizei o par de cabeças-urna expostas e no Museu Jorge
Vieira.
Depois comecei a
desenvolver a idéia para a peça Ressonâncias, cerca de 2 anos ensaiando
compreendendo o que fazia. Comecei por fazer o molde em gesso da minha cabeça,
depois de dentro dele tirar o positivo em cera e depois em terracota e por fim
realizar os moldes-cápsulas em terracota.
Assim configurando a 1ª peça (RESSONÂNCIA I) uma roda de 9 Moldes- Urna, agora designadas de CAPSULAS,
terracota selada com cera de abelha.
Aqui a escultura, a idéia de origem, a idéia
de matriz, o processo mais tradicional, que leva ao resultado final em bronze
ou em cerâmica, os materiais e processos técnicos, começaram também a ser metáforas da obra. Uma reflexão que se apropria do processo da escultura para
a tornar em metáfora. A criação: vida
e morte, num contínuo ciclo de arte e vida.
A idéia de nascimento e morte faz parte da
nossa condição e, portanto nesta peça a idéia de vazio, evoca
os nossos processos de crescimento.
Os vazios que se vão criando ao longo da vida, as expectativas e o não resolvido. Acredito que as mulheres guardam muitas
coisas não resolvidas como nódulos, pequenos traumas, dentro de si, coisas que
eventualmente foram emoções fortes, vitais.
É muitas vezes essa
a matéria da arte. Nódulos, vazios, espaços inacessíveis, que podem ser usados como espaços potenciais para o
desenvolvimento da criação artística,
aos quais acedemos de forma muitas vezes intuitiva dentro dos processos de
trabalho.
Assim é isto que
compartilho convosco, é este o centro deste trabalho, a Ressonância.
Quando iniciarem e já com a vossa cabeça na
mão: uma máscara funerária, a cópia tridimensional , como nunca a viram ou
tocaram, uma forma tão crua e
inesperada. Teremos aí um 1º momento de confrontação: o tamanho da cabeça, as
sua formas. Uma estranheza deparamos com uma coisa sem expressão, mais real as
nossas cabeças, uma coisa morta.
É neste momento
que tudo começa. Um questionamento sobre nós, sobre o corpo, sobre o
tempo e sobre a vida.
O que se pretende é
que o processo seja gerador de questionamentos internos que depois ajudem a um
crescimento pessoal, individual. O que eu penso que este processo vos vai dar é
o exercício da reflexão e da
superação, com dizia o poeta João Cabral
Neto em Morte e vida Severina: “saltar para dentro da vida, dar o seu
primeiro grito....”
Um renascer, um
emergir , leve e alegre.
ZAMBRANO, Maria
(2005). O sonho criador, Lisboa: Assírio & Alvim
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